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Cortisol face: como o stress se manifesta no rosto

É difícil esconder uma vida agitada. O stresse estampa-se no nosso rosto, sem que o consigamos conter, resultando, de acordo com as redes sociais, na cortisol face: aspeto mais inchado,  sem contorno definido e uma tez sem luminosidade. Mas será mesmo assim?

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Cortisol face: como o stress se manifesta no rosto Cortisol face: como o stress se manifesta no rosto
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Inês Aparício
Escrito por
Set. 11, 2025

Contrariamente ao que tendemos a acreditar, o stresse é uma resposta natural ao perigo e, portanto, benéfica. Mantém-nos alerta e, por consequência, protege-nos de situações que poderiam colocar a nossa vida em risco. O problema é quando não conseguimos diferenciar uma clara ameaça à nossa integridade física, nomeadamente um ataque de um qualquer animal feroz, de algo quotidiano como a apresentação de um projeto no trabalho.

No entanto, são estas pequenas (grandes) situações que nos deixam, no dia a dia, com a respiração acelerada, tremores nas mãos ou insónias. Afetando cada vez mais pessoas por todo o mundo – em Portugal, uma em cada três pessoas dos 15 aos 74 anos sofre desta condição, de acordo com o estudo TGI da Marktest –, o stresse foi classificado pela Organização Mundial da Saúde como a “epidemia do século XXI”.

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Intimamente relacionado com este “estado de preocupação ou tensão mental causada por uma situação difícil”, como a instituição o define, está o cortisol, a designada hormona do stresse, que fez muitos influenciadores carregar no botão de gravar. Porquê? Devido às alegações de que está por detrás do inchaço, perda de firmeza e opacidade da tez do nosso rosto, em particular, de manhã.

“Não és feia, apenas tens cortisol face, assume-se em vários vídeos partilhados nas redes sociais, nos quais são comparadas imagens com a cara arredondada e volumosa, que garantem corresponder ao “antes”, e, resultando, de acordo com as depois, com as maçãs do rosto e queixo definidos. Mas o que significa este termo? “A chamada cortisol face não é um termo clínico reconhecido, mas sim uma expressão informal, popularizada nas redes sociais, para descrever as alterações visíveis no rosto associadas ao stresse crónico e aos elevados níveis de cortisol”, começa por explicar Luís Uva, médico dermatologista.

Impacto do cortisol

Também conhecida como face em lua cheia, costuma referir-se a uma combinação de pele inflamada, pálida ou baça, olheiras acentuadas, perda de firmeza e contorno facial menos definido”, descreve. Além disso, “a curto prazo, pode manifestar-se através de episódios de acne, vermelhidão, rosácea exacerbada, comichão ou mesmo eczemas”, menciona o dermatologista, justificando: “isto acontece porque o stresse ativa o sistema nervoso simpático, levando à libertação de mediadores inflamatórios e ao aumento da produção sebácea”.

“Quando os seus níveis estão persistentemente elevados, o impacto na pele é profundo: reduz a produção de colagénio, afeta a regeneração celular e compromete a capacidade de a pele reter água, tornando-a mais seca e sensível”, acrescenta. A longo prazo, contribui, então, para a aceleração do envelhecimento cutâneo. “A nível molecular, interfere com a síntese de colagénio e elastina, proteínas essenciais para a firmeza e elasticidade da pele. Promove também o stresse oxidativo e a inflamação crónica de baixo grau, o que acelera o processo de degradação celular.

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O resultado é uma pele mais fina, com rugas precoces, perda de luminosidade e flacidez”, completa. Deste modo, apesar de sublinhar não ser um termo médico, o dermatologista admite que o conceito “traduz uma perceção real de alterações cutâneas associadas ao estilo de vida”. Ainda assim, declarar que afeta todos os que experienciam stresse é falacioso.

“Embora elevados níveis de cortisol possam levar a um inchaço facial, é habitualmente visto em distúrbios endócrinos severos e não relacionado com o stresse que a maioria das pessoas sente no seu dia a dia”, sublinha Vijay Murthy, especialista em medicina funcional, em declarações à plataforma digital Healthline. Aliás, “em grande parte dos casos, o stresse quotidiano não é suficiente para elevar o cortisol aos níveis necessários para se manifestar de uma forma tão dramática”, acrescenta, esclarecendo que “seria preciso uma persistente e anormal sobreprodução de cortisol, que não é comum em situações típicas de stresse”.

Selma Souto, endocrinologista, esclarece que este tipo de sintomas, assim como “rubor facial, hematomas fáceis, estrias avermelhadas na região abdominal e fraqueza muscular nos antebraços e coxas”, podem ser indicativos de uma situação clínica conhecida por síndrome de Cushing, que resulta de um aumento dos níveis de glicocorticoides (hormonas de stresse, nas quais se inclui a cortisona e o cortisol). Esta doença, que requer atenção médica, é comum entre pessoas que tomam medicamentos para o tratamento de doenças alérgicas, como “hidrocortisona, prednisolona, deflazacort, metilprednisolona, dexametasona, ou imunomediadas”, pode ler-se no site da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo.

Porém, “quando resulta da produção de quantidades excessivas de glicorticoides pelo nosso próprio corpo (Cushing endógeno), falamos de uma doença rara, estimando-se que afete 40 a 70 pessoas por cada milhão”, refere ainda.

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Manifestações comuns do excesso de cortisol

  • Acne
  • Fadiga
  • Irritabilidade
  • Redução da libido
  • Pele oleosa e fina
  • Alterações menstruais
  • Dificuldade em dormir
  • Redução da concentração
  • Dificuldades de cicatrização
  • Alterações da memória e do humor
  • Aumento do peso corporal e depósitos de gordura em determinadas zonas

Aparência do stresse ou stresse com a aparência?

Este conceito parece, no entanto, levantar algumas questões. Estaremos, mais uma vez, a criar problemas onde não existem? Estaremos a colocar ainda mais pressão na nossa aparência? Mais do que isso: estaremos a enquadrar características normais como problemas médicos quando não existe necessidade disso?

Tal como o envelhecimento, com o qual temos tanta dificuldade em lidar, sinais comuns de fadiga e stresse são interpretados como sintomas a diagnosticar, tratar e prevenir mesmo quando não existe uma patologia clínica subjacente. E a cortisol face é prova disso mesmo.

Neste cenário, não só a saúde e o bem-estar se tornam uma obsessão, mas também a aparência da saúde. Não podemos acusar quaisquer indícios de que estamos a ter uma semana especialmente complicada, dormimos mal ou não conseguimos simplesmente gerir o caos que a nossa vida, por vezes, é. Afinal, isso seria admitir a derrota; uma falha num mundo em que todos parecem ter uma vida organizada, estável e sob controlo. Isto traz, claro, mais pressão e, por consequência, um stresse extra, gerando um círculo vicioso e sem fim.

Encontrar soluções para a cortisol face (e nao só)

Tudo isto traz também para cima da mesa possíveis soluções para minimizar os sintomas e tentar manter os níveis de cortisol equilibrados. “O primeiro passo é, inevitavelmente, atuar na raiz do problema: gerir melhor o stresse. Técnicas de relaxamento, como meditação, mindfulness, exercício físico regular e uma boa higiene do sono são fundamentais”, avança Luís Uva.

Selma Couto acrescenta que “deve ainda ser evitado o consumo excessivo de álcool e cafeína”. Manter uma dieta equilibrada e variada, rica em antioxidantes, na qual priorizamos alimentos anti-inflamatórios, nomeadamente legumes, fruta, peixe e especiarias como a pimenta-preta, curcuma e gengibre, também é crucial. “O que se passa no organismo reflete-se inevitavelmente na pele”, recorda o dermatologista.

Já de uma perspetiva dermatológica, “é essencial manter uma rotina de cuidados de pele adequada, focada na hidratação, na proteção solar e na utilização de ativos antioxidantes e regeneradores – como a vitamina C, o retinol e os peptídeos. Em casos mais marcados, pode ser necessário recorrer a tratamentos médicos, como peelings, lasers ou bioestimulação com injeções de ácido hialurónico e vitaminas”, frisa o médico.

A versão original deste artigo foi publicada na revista Saber Viver nº302, agosto de 2025.

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