Viagens e lazer

Este é o roteiro que precisa para conhecer Malta

Em Malta, encontrámos, além de um mar azul-turquesa, uma notável arquitetura medieval que dá um ar misterioso às suas cidades, que já foram cenário para muitos filmes, templos megalíticos e uma Natureza selvagem.

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Este é o roteiro que precisa para conhecer Malta Este é o roteiro que precisa para conhecer Malta
© VISIT MALTA
Rita Caetano
Escrito por
Jun. 27, 2025

A sua posição estratégica no Mediterrânico fez de Malta uma terra muito desejada. Aqui estiveram os fenícios, os romanos, Napoleão e os britânicos. São mais de sete mil anos de história e que história, daí que não seja apenas um destino de mar. Uma viagem de 25 minutos de ferryboat leva-nos do porto de Cirkewwa, na ponta norte de Malta, à ilha de Gozo, que será o ponto de partida para quatro dias neste país.

Durante o curto percurso, passámos ao lado de Comino, a outra ilha do arquipélago, e conseguimos ver as águas claras da Blue Lagoon, um dos locais mais conhecidos de Comino. É com Stephen Tabone, proprietário do agroturismo Tuta, que passamos a manhã. Ele e o irmão, Jochen Tabone, decidiram dar uma nova vida à propriedade da família. Situada num ponto alto, tem vista tanto para o mar como para o campo onde está inserida e para as localidades que a rodeiam.

“Abrimos as portas há pouco mais de um ano, temos dez quartos, e a sustentabilidade é a base do projeto. Recolhemos a água da chuva para a reutilizar, temos painéis solares, separamos o lixo e usamos os produtos que produzimos no nosso restaurante”, conta-nos. No quartos Deluxe, até o jacuzzi é alimentado por uma lareira. Mas a propriedade é muito mais do que a parte hoteleira. Com Stephen Tabone como guia, visitámos os animais (cavalos, porcos, avestruzes, vacas), as plantações de cogumelos e a estufa de tomate.

Um dos próximos passos é levar os hóspedes a participarem em atividades agrícolas. “A minha visão do turismo de qualidade passa por experiências e pela exclusividade”, diz. Pelo caminho, vai-nos chamando a atenção para as plantas e frutos que que crescem espontaneamente. O nosso anfitrião é chef e o forrageio é algo que faz parte integrante da sua cozinha. Já no restaurante, Stephen Tabone sai da cozinha com uma tábua com o melhor que a quinta tem para oferecer.

ravioli fritos, vários tipos de queijos e enchidos que o próprio faz, bruschette, rúcula selvagem, entre outros. “Sou um pouco louco, gosto de experimentar coisas novas e de trazer as tradições culinárias para os nossos dias, sempre respeitando a sazonalidade”, algo que não é de estranhar para alguém que cresceu numa quinta.

Cenários de filme

A estrada que nos leva à baía de Dwejra, é cénica, entre o verde da vegetação e a pedra amarelada. Em Dwejra, sobressaem as arribas, as rochas decoradas com vários fosseis marinhos e com várias poças de água e o mar, que aqui se divide em dois: o aberto e um mar interior que forma uma baía que surge abraçada por casas de pescadores, que hoje são quase todas casas de verão, como refere Vincent DeBono, o guia que nos acompanhou ao longo da toda viagem.

Os amantes da Guerra dos Tronos, vão sentir que já lá estiveram. Desse mar interior é possível ir a nadar até ao mar aberto por um túnel de 100 metros. Os menos afoitos podem fazê-lo em pequenos barcos. É aqui também que se situa o Blue Hole, “um dos dez locais do mundo melhores para fazer mergulho,”, realça o guia.

Acessos ao mar na ilha de Gozo.

©Getty Images

A caminho de Rabat, a capital de Gozo, parámos nas salinas de Xwejni, escavadas na rocha há 350 anos; e na Basílica de Ta Pinu, um local de peregrinação por ali ter sido escutada a voz de Nossa Senhora. Em Rabat, também conhecida como Victoria, subimos à cidadela, a antiga cidade fortificada. Uma caminhada ao longo das muralhas dá a possibilidade de ter um panorama geral, mas é também obrigatório percorrer as ruelas estreitas e contemplar o largo da igreja. Parece que o tempo voltou para trás. E essa viagem pode recuar ainda mais na gruta de Calypso.

Salinas de Xwejni.

©Visit Malta/Katja Spoljar

Reza a história, como nos conta o nosso guia, que este local é mencionado na Odisseia como o lugar onde a ninfa Calipso manteve Ulisses prisioneiro. Dela avista-se a melhor praia de Gozo, Ramla Bay, de areia alaranjada.

Gruta de Calypso.

©Visit Malta

Filigrana, uma arte maltesa

No segundo dia por terras maltesas, tínhamos encontro marcado com Josianne Calleja, joalheira de filigrana, técnica tradicional em Malta. É no centro de Rabat, que se situa a loja Lartigjana, que a artesã abriu, em fevereiro de 2004, com mais três artistas: Petra Gasan, que faz bordados e macramés; Rosalie Sammut, que trabalha cimento; e Nabiha Tamin, pintora. “É um projeto de empoderamento feminino do qual tenho muto orgulho em fazer parte”, afirma a joalheira, que desde muito jovem se interessou pelas técnicas artesanais.

“Aprendi com os grandes mestres e é importante não deixarmos morrer esta tradição”, conta-nos enquanto nos tenta ensinar. Nas suas mãos parece simples; nas nossas complica-se. Faz brincos, a famosa cruz de Malta, anéis e outras peças.

©D.R

Depois de conhecermos este projeto do presente, voltámos ao passado de Malta, no Museu Wignacourt. Situado num edifício barroco, tem uma galeria com várias pinturas de artistas nacionais e estrangeiros e peças clericais. Já nas catacumbas, com mais de dois mil anos, há vários túmulos e a Mesa de Ágape, onde outrora se celebravam banquetes antes dos enterros, proibidos depois pela Igreja Católica. Foi também nestas catacumbas que São Paulo se refugiou depois de naufragar na ilha, em 64 d.C. Séculos depois serviram de abrigo para a população aquando da II Guerra Mundial.

“Malta foi o país mais bombardeado”, lembra-nos Vincent DeBono, que nos chama a atenção para alguns dos cubículos terem azulejo. “Traziam-nos das suas casas destruídas para tornarem o espaço mais acolhedor”, conta-nos. Pensar que aqui se esconderam tantas pessoas sem luz natural e um ar rarefeito é arrepiante.

A misteriosa Mdina

Com um pastizzi, um pastel maltês, que neste caso era recheado com queijo e ervilhas, na mão dirigimo-nos a Mdina, logo ali ao lado. Ao entrarmos nas muralhas, viajámos de novo no tempo. A cidade, que tem uma atmosfera misteriosa ajudada pelas inúmeras ruelas que a percorrem, tem quatro mil anos de história, uma arquitetura medieval e barroca feita de palácios e igrejas. A principal é a imponente Catedral de São Paulo. Foi aqui que encontrámos Raymond Saliba, assistente de curadoria do museu e é ele que nos guia por este local de culto católico e pelo espaço museológico.

Mdina.

© Visit Malta

“Foi destruída pelo terramoto de 1693 e reconstruída por Lorenzo Gafà em 1702”, refere, chamando-nos a atenção para as lápides de mármore e para as pinturas de artistas como Mattia Pretti. Com o fim do dia a aproximar-se, ainda houve tempo de fazer uma paragem na Rotunda de Mosta, uma igreja em formato redondo, que parece demasiado grande para o tamanho da localidade. “Foi resultado da rivalidade entre cidades vizinhas”, diz-nos o guia, que adianta ainda que foi alvo de um bombardeamento na II Guerra Mundial, mas toda a gente se salvou.

Rotunda de Mosta.

©D.R

Passado e presente

Valletta, a capital recebe-nos ao terceiro dia de viagem e é nos jardins Upper Barrakka que começamos a visita. É um magnífico miradouro para a Città Vittoriosa, para o porto e para o forte Ricasoli, onde foi filmado o Gladiador. Aliás, no jardim, há uma placa onde são indicados todos os filmes que foram gravados nas redondezas, e são muitos. As ruas da capital são um autêntico sobe e desce e dá vontade de fotografar todas as varandas que dão cor à cidade e parar na maioria das esplanadas que fazem com que a cidade seja vibrante noite e dia.

Valleta.

©Unsplash

Além das lojas comuns, há algumas que se destacam como a D’Amato, loja de música fundada em 1885, e a perfumaria artesanal Stephen Cordina Aroma & Therapy, a primeira do género no país. O Teatru Manoel, a biblioteca e a Casa Rocca Piccola (uma casa-museu que pertence à nobre família De Piro que mostra como era a vida doméstica maltesa do passado) são de visitar, mas é a Catedral de São João que arranca mais uaus. É um dos mais notáveis edifícios de arte barroca do mundo.

Jardins Upper Barrakka.

© Visit Malta

No Oratório, guarda a obra-prima de Caravaggio Decapitação de São João. O pintor italiano veio para Malta fugir da prisão em Roma, mas acabou por ser preso em terras maltesas, mostrando que a mudança não lhe alterou a índole conflituosa. O certo é que conseguiu fugir do Forte Ricasoli. “Como foi possível?”, é a pergunta que Vincent de Bono deixa no ar.

Valleta.

©Pexels

Birgu, a vitoriosa

O último dia em Malta começou em Birgu, também conhecida como Città Vittoriosa. Tem vista para Valleta e uma forte tradição marítima. A Igreja de São Lourenço é um dos locais que se destacam. Somo recebidos por pelo grupo de voluntários que tomam contam da igreja. Chamam-nos a atenção para o padroeiro pintado por Mattia Preti, situado no altar principal, para o órgão e depois guiam-nos pelo museu repleto de relíquias.

Birgu.

© Visit Malta/We Seek Travel – Olly Gaspar

Outro ponto de paragem obrigatória é o Palácio do Inquisidor, no qual é possível conhecer a histórias dos dois séculos de Inquisão em Malta, que terminou com a chegada dos franceses no século XVIII. É possível ver os aposentos dos inquisidores, mas também as celas e os locais onde eram ouvidos os hereges. Além disso, há um pequeno vídeo que conta a história da condenação de dez escravos por conspiração.

As ruas de Birgu devem ser contempladas com calma, a cidade foi quase toda praticamente destruída durante a II Grande Guerra, mas mantém o charme de outros tempos depois de uma recuperação que demorou 35 anos. Um pormenor: uma cabine telefónica ao estilo britânico é agora uma biblioteca, onde é possível deixar e tirar livros.

Birgu.

© Visit Malta/ Wonguy Photography

A caminho do Complexo Arqueológico de Hagar Qim e Mnajdra, passámos por Marsaxlokk, uma aldeia piscatória no extremo sul da ilha, e no miradouro da Gruta Azul, onde as arribas branqueadas desenham a paisagem e acabam no mar. Já no complexo referido atrás, não há como não ficar perplexo com a dimensão das pedras. Como as terão trazido até aqui, é a grande dúvida. O primeiro está situado no topo da colina, e o segundo, no sopé da mesma no meio de vegetação mediterrânica.

Miradouro da Gruta Azul.

© Visit Malta

Deles sabe-se pouco, nem tão-pouco a função, apenas que foram contruídos entre 5000 e 2000 A.C. A visita começa com um filme 3D que mostra como eram, como quase despareceram e como estão hoje, protegidos por uma espécie de tenda. Acabámos a viagem quem sabe no início daquilo que hoje é Malta…

Informações úteis

Como ir

A Ryanair tem voos diretos de Lisboa e Porto para Malta. Para se deslocar no país, tem sempre a hipótese de alugar um carro, mas atenção que conduzem à esquerda. Os transportes públicos são sempre uma opção e, para ir aos locais onde não é possível com eles, há táxi ou TVDE e visitas guiadas com transporte

Onde ficar em Malta

Waterfront Hotel: Situado na marginal de Sliema, uma cidade às portas de Valetta, à qual se chega facilmente de autocarro ou de ferry, numa viagem que não chega a 15 minutos, os seus quartos virados para o mar têm uma vista fascinante para a baia e para Valetta. O hotel tem três restaurantes, um rooftop, um spa, uma piscina interior e uma exterior. Preço: A partir de 75€.

Onde comer

A gastronomia maltesa tem uma forte influência italiana, mas é também polvilhada com sabores do norte de África.

Trattoria AD 1530: Está localizada no The Xara Palace Boutique Hotel, da cadeia Relais & Châteaux. Além de pizas e massas, tem vários pratos principais, como o duo of local pork, que vale a pena provar.

©Trattoria AD 1530

Caffe Cordina: É um dos cafés mais antigos de Valetta e a sua decoração clássica atesta isso. Além da parte de pastelaria, tem refeições. Experimente, por exemplo, os ravioli de ricotta local com o molho de tomate ao estilo maltês.

Fifty Nine Republic: Localizado no centro de Valetta, é um restaurante onde a inovação é uma constante. Os tacos de camarão, e os arancini de lagosta são de experimentar, bem como o bife Wellington.

Don Berto: Localizado na marina de Birgu, é um restaurante italiano e o linguini com polvo e lulas é uma excelente opção.

A versão original deste artigo foi publicada na revista Saber Viver nº 296, fevereiro de 2025.

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