Sociedade

Geração Z: os jovens que não têm medo de mudar

Segundo um estudo realizado pela espe­cialista em recrutamento Hays, Talento Z: Os Nativos Digitais no Mercado Laboral, a geração Z é a mais qualificada de sempre, com especial interesse pela área da gestão.

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Geração Z: os jovens que não têm medo de mudar Geração Z: os jovens que não têm medo de mudar
© Getty Images
Vanessa Pina Santos
Escrito por
Dez. 04, 2019

“Os millennials, em Portugal, não estiveram sujeitos a uma escolaridade obrigatória que vai até aos 18 anos. Ao contrário desta nova geração, que apresenta níveis de qualificação potencialmen­te maiores em comparação com os mais velhos”, explica-nos a socióloga e a coor­denadora do Observatório Permanente da Juventude, Maria Manuel Vieira à Saber Viver.

No entanto, esta é uma geração que enfrenta problemas de integração no mercado de trabalho. “Não quer dizer que seja uma geração com desemprego à entrada, mas a questão é que os empregos que encontram têm condições muito precárias”, diz-nos o sociólogo Bernardo Coelho. Por precariedade entende-se falsos recibos verdes e, principalmente, salários baixos.

A geração Z quando não está satisfeita com o empre­gador não tem qualquer problema em sair e procurar outra alternati­va que vá ao encontro das suas expectativas, Solange Soares, team lea­der da Hays.

A verdade é que nunca uma geração ga­nhou tão mal em Portugal. O rendimen­to salarial dos jovens no nosso País está muito abaixo da média da Europa. Este é um problema de geração e também de género, porque, embora as raparigas se­jam mais qualificadas do que os rapazes, “enfrentam mais frequentemente esses cenários de precariedade no mercado de trabalho”, diz-nos o sociólogo.

Mas, nem tudo é mau. Uma das diferenças entre esta geração e a anterior é a forma de como ambas as gerações (millennials e geração Z) olham para as soluções. A nova geração encontra facilmente outras alternativas de trabalho, procurando por formas de autoemprego mais ligadas às novas tecnologias. Em comparação com os millennials, a geração Z é muito menos conformista.

“A geração Z quando não está satisfeita com o empre­gador não tem qualquer problema em sair e procurar outra alternati­va que vá ao encontro das suas expectativas”, afirma Solange Soares, team lea­der da Hays.

Aliando isto às condições precárias do mercado de trabalho, esta é uma geração que tendencialmente, ao longo do seu percurso profissional, passa por diversas empresas. Contudo, não é este o seu desejo. O estudo já citado da Hays, concluiu que “a geração Z é, de todas as analisadas, a que quer trabalhar em me­nos empresas diferentes”.

Estar oito horas no escritório? Não, obrigado

Esta será a geração que provavelmente terá de trabalhar pelo menos até aos 70 anos. No entanto, a forma como olha para o trabalho está a mudar, uma tendência que já começou com os millennials. Falamos de flexibilidade de horários e da possibilidade de trabalhar a partir de casa. Cada vez mais, os jovens procuram o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal. O trabalho deixou de ser um ‘lugar’ para passar a ser ‘algo’ com a mesma importância de outra coisa qualquer.

Com a geração Z, o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal (que pede flexibilidade de horários) tornou-se muito mais impor­tante do que propriamente as recompensas salariais mais va­lorizadas pelos millennials, por exemplo. No estudo Talento Z, 72% dos jovens da geração Z diz valorizar o bom ambiente no trabalho.

Além disso, esta geração atribui uma maior importância a outro tipo de recompensas, como, por exemplo, seguro de saúde, formações, Internet para uso próprio e dias de férias extra.

Um novo desafio para as empresas

“Em Portugal, temos empre­sas muito antigas no mercado que, por vezes, têm as quatro gerações a trabalhar e, neste sentido, poderão existir alguns desafios”, diz-nos Solange Soa­res. Este desafio não é novo. Um estudo, realizado pela con­sultora PWC, sobre os millen­nials mostra que mais de meta­de dos jovens sente que os seus gestores nem sempre compreendem a forma como é usada a tecnologia no trabalho. Trinta e oito por cento afirma que os se­niores não se relacionam com a geração mais jovem.

Hoje em dia, as mudanças constantes de empresa não devem ser mal interpretadas como eram há uns tempos”, So­lange Soares

Como a geração Z não tem qualquer problema em se des­pedir e procurar outras alter­nativas, é necessário que as empresas criem mecanismos para incentivar estes jovens. Quando questionados sobre o tempo que consideram razoá­vel para subirem de posição, os jovens da geração Z responde­ram entre um e dois anos, “en­quanto que os baby boomers e a geração X estão dispostos a aguardar entre dois e cinco anos por uma promoção”, lê-se no estudo já mencionado da Hays.

Ainda no mesmo estudo refere-se que “para a geração Z, apenas as empresas multinacionais se mostram apelativas.” O que se revela num problema para Portugal, maioritariamente constituído por PME (Pequenas e Médias Empresas).

Neste sentido, a forma como as empre­sas avaliam o percurso profissional dos seus candidatos também vai ter de mudar. “Hoje em dia, as mudanças constantes de empresa não devem ser mal interpretadas como eram há uns tempos”, explica So­lange Soares.

Os caminhos não são lineares

A precariedade do trabalho leva a que as perspetivas de futuro destes jovens se­jam construídas com base na incerteza. Por isso, é que tendem a ter mais do que uma alternativa e também a seguir ca­minhos que são o oposto do tradicional.

“Se, há umas gerações, nós tínhamos os percursos de vida muito lineares, ou seja, estudávamos, começávamos a trabalhar, eventualmente casávamo-nos e tínhamos filhos e íamos progredindo nas nossas pro­fissões, o mesmo já não acontece com a geração Z, porque a entrada no mercado de trabalho também não é tão linear”, ex­plica Bernardo Coelho.

Por outro lado, também existem outras opções que não existiam há uns anos, o que faz com que esta geração experimente várias coisas, até finalmente decidir o que quer. Além disso, a instabilidade em que vivem também faz com que seja difícil sair da casa dos pais mais cedo ou começar uma vida a dois.

Apesar disso, “a família e o trabalho continuam a constituir valores importantes para os jovens”, refere Maria Manuel Vieira. No entanto, está a verificar-se uma alteração na forma como se pensa no conceito de família. “Hoje em dia, há uma pluralidade de possibilidades de famílias que é bastante mais alargada do que foi no passado”, explica a socióloga.

Versáteis e empreendedores

Esta geração foi ensinada a adaptar-se, porque “sofreu na família ou com esta os efeitos da crise económica que afetou muitos pais e provocou muito desempre­go. Há uma série de vivências que terão marcado a sua existência”, afirma a coor­denadora do Observatório Permanente da Juventude, explicando que a crise teve impactos diferentes entre a geração Z e os millennials. Estes últimos tiveram um embate mais direto, visto que, na altura, estavam a tentar entrar no mercado de trabalho.

“Os millennials passaram por momentos de crise, não estão tão aber­tos ao risco. Já a geração Z é muito mais propícia a criar o seu próprio negócio, porque nasceu no tempo dos unicórnios (startups tecnológicas que são avaliadas em mais de mil milhões de dólares)”, afir­ma Solange Soares.

A versão original deste artigo foi publicada na revista Saber Viver nº 233, novembro de 2019.

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