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Crónica. E se tudo o que sabe sobre sexo estiver errado?

Crónica. E se tudo o que sabe sobre sexo estiver errado?

Talvez estejamos a chegar à conclusão que, tudo o que aprendemos sobre sexo e intimidade em relacionamentos de longo prazo, está errado! É necessário desaprender, para aprender de novo, e amarmos melhor.

Por Jun. 4. 2025

O primeiro contacto que muitos de nós tivemos com a sexualidade foi através de filmes pornográficos, que na verdade circulam scripts, ideias ou até papéis (homem vs mulher) bastante afastadas acerca de como uma sexualidade gratificante poderá ser vivida.

Muitos de nós aprendemos que deveríamos trazer novidades constantes para experimentar na nossa vida sexual. Que o início do fim desta começaria com a ausência de aventura ou de estimulação insuficiente. Corremos por isso atrás de novas dicas fascinantes, de novas posições sexuais ou da lingerie mais sensual.

Contudo, a ciência indica que o que realmente determina a qualidade do sexo que temos reside em quão seguros nos sentimos na ligação emocional com a nossa pessoa parceira. Ou seja, é a segurança emocional, traduzida pela qualidade da presença emocional, que se torna no maior afrodisíaco de todos!

Assim, o segredo para ter um sexo absolutamente incrível, reside na construção de uma conexão emocional profunda.

O sexo é um comportamento de vinculação

A ciência indica-nos que o sexo é um comportamento de vinculação.

Vínculos seguros que contém a acessibilidade e a responsividade emocional da pessoa parceira potenciam a sexualidade adulta. Uma sexualidade segura, da qual a conexão emocional e o vínculo fazem parte. Em que a paixão, unida ao vínculo, constrói uma conexão erótica. É a emoção que advém da qualidade da nossa conexão com outra pessoa, que define o tipo de sexo que fazemos e o impacto que este assume na nossa relação.

Neste sentido, olhemos para um casal com um vínculo seguro e para um casal com vínculo inseguro.

Casal com vínculo seguro

Um casal tem um vínculo seguro quando ambos sentem que estão firmemente ligados, podendo contar um com o outro e compartilhar qualquer coisa que os angustie. Quando os elementos de um casal conseguem voltar-se um para o outro, receber e oferecer conforto, cuidado, atenção, suporte emocional e amor, sentem-se igualmente mais confiantes não só consigo mesmos, mas com o mundo ao seu redor.

Casal com vínculo inseguro

Quando um casal perceciona que não pode contar um com o outro, quando ambos os elementos sentem-se rejeitados, incompreendidos, atacados, não escutados, culpados, poderá ser um indicador de que podem estar num vínculo inseguro.

Num vínculo inseguro ansioso, um elemento do casal poderá sentir-se muito preocupado face ao sentimento de amor e atração da pessoa parceira. Num vínculo inseguro evitante, o elemento do casal poderá procurar defender-se com frequência da vulnerabilidade, da dependência e reatividade emocional da pessoa parceira.

É a emoção que advém da qualidade da nossa conexão com outra pessoa, que define o tipo de sexo que fazemos e o impacto que este assume na nossa relação

Os diferentes vínculos poderão dar origem a três tipos de sexo:

Sexo isolado

Gira em torno da redução da tensão sexual, priorizando a sensação e o desempenho pessoal em detrimento da conexão emocional com a pessoa parceira. Numa relação casual poderá ser aceitável, contudo surge como um desafio num relacionamento de longo prazo, podendo até ser prejudicial. Neste tipo de sexo, os parceiros estão concentrados no desempenho, na novidade, na estética e nas sensações, tornando-se num sexo muito voltado para objetivos.

A ausência de conexão emocional, numa forma de sexo impessoal, poderá fazer a pessoa parceira sentir-se emocionalmente isolada, usada e vazia do ponto de vista emocional.

Quando o sexo isolado se torna norma numa relação, poderá sinalizar a necessidade de lidar com a ausência de conexão emocional segura fora do quarto. Os elementos do casal poderão sentir-se desconectados e não se sentirem importantes um para o outro. Deste modo, será importante promover o conforto e a segurança diante da intimidade emocional, assim como o prazer para uma sexualidade saudável e gratificante.

Este tipo de sexo é geralmente mais praticado por pessoas com padrão de vinculação inseguro evitante.

Sexo de consolo

Este tipo de sexo manifesta-se quando os elementos se mostram incertos e inseguros quanto ao compromisso da pessoa parceira. Através do sexo, os elementos procuram a segurança emocional, em vez de se envolverem plenamente na relação sexual. Esta forma de intimidade, absolutamente centrada no toque, nos abraços e no afeto, sacrifica o aspeto erótico do sexo.

A hipersensibilidade a sinais de rejeição, ou a dúvida e incerteza quanto ao afeto e atração da pessoa parceira por si, conduz a pensamentos catastróficos ou a discussões intensas. O sexo é visto como uma prova de amor! É aconchegante, mas não necessariamente apaixonado.

A comunicação do casal é um elemento essencial para que exista uma comunicação efetiva sobre aquilo que provoca ansiedade e insegurança na relação. As emoções mais vulneráveis deverão ser expressas e de novo escutadas pela pessoa parceira, para que a segurança emocional possa ser realmente construída na relação e a sexualidade plenamente vivida.

O sexo de consolo destaca a importância de atender às necessidades emocionais, de forma a construir-se uma conexão emocional segura e consequentemente desenvolver-se os aspetos emocionais e físicos da relação.

Os parceiros que praticam mais este tipo de sexo demonstram frequentemente um padrão de vinculação inseguro ansioso.

Sexo sincrónico

Este tipo de sexo advém de aspetos presentes no vínculo entre os elementos, tais como a abertura emocional, a responsividade emocional, o toque delicado, a possibilidade de exploração erótica dentro de um vínculo emocional que ambos os elementos sentem como seguro. O grande elemento presente nesta forma de intimidade sexual é o estabelecimento de segurança emocional. Sentir-se emocionalmente seguro numa relação, permite uma comunicação efetiva e construtiva, onde o casal expressa as suas emoções e necessidades, a exploração lúdica e o relaxamento (em oposição ao sentimento de ameaça) diante das experiências sexuais.

Neste tipo de sexo, os elementos sintonizam-se, coordenando uma dança sexual que responde a mudanças e picos de excitação. A interação entre a segurança emocional e a sincronia física reforçam-se mutuamente.

O sexo sincrónico aprofunda o vínculo entre os parceiros da relação, reforçando igualmente a atração que sentem, transformando a sexualidade num momento pleno de prazer e bem estar. No sexo sincrónico, os elementos estão focados no momento. Este envolve uma comunicação clara, a expressão das necessidades, bem como a capacidade de se render e de se sintonizar. Por norma, quando os elementos do casal estão em sintonia, então é porque se encontram envolvidos emocionalmente.

Desta forma, existem alguns aspetos que todos nós deveríamos desaprender ou a aprender de novo, de forma correta, de modo a ser trazido para a relação amorosa e que poderão ser transformadores a nível emocional e sexual.

Dicas para melhorar a sua vida sexual

1. Reaprender a sintonizarem-se emocional e sexualmente

Andamos constantemente em correria. Esquecemo-nos da importância de parar, ser e estar. Desintonizamo-nos da vida, do outro ou mesmo de nós mesmos. Quando o casal perde a sua sintonia emocional, é como perder o caminho de regresso a casa. Diante desta questão, talvez os elementos do casal possam refletir sobre o que é realmente a sintonia.

É John Gottman, um terapeuta de casal de referência, que nos indica que para existir sintonia devemos então ter em conta alguns aspetos como: Consciência, Voltar-se para o outro, Tolerância às emoções e diferentes perspetivas da pessoa parceira, Compreensão do outro, Responsividade e não defensividade, Empatia.

São muitos os casais que necessitam de voltar a trabalhar na construção da sua intimidade emocional e sexual. Para isso, deverão procurar sintonizar-se emocionalmente de novo. Ou seja, prestar atenção às emoções (as suas e as da pessoa parceira) e comunicá-las.

Há que sintonizar e mergulhar nas emoções vulneráveis de cada elemento do casal para a promoção de uma maior sintonia, intimidade e, desta forma, uma sexualidade mais plena! Se as emoções são percecionadas como a música da dança, sexo sem emoção seria como dançar sem música. A sintonia emocional é fundamental para uma intimidade emocional e sexual gratificantes!

2. Aprender sobre os travões e aceleradores um do outro

São muitos os casais que se sentem perdidos na sua desconexão, no caminho de volta um para o outro. São poucos os casais que sabem profundamente como funciona o seu corpo e o corpo da sua pessoa parceira. São poucos os casais que sabem as necessidades emocionais um do outro. São alguns os casais que sabem quais são os aceleradores da sua pessoa parceira, mas desconhecem os travões que estão ou podem estar ativados em cada momento.

É urgente os casais aprenderem sobre o Modelo de Resposta Dupla da sexualidade humana, para melhor compreenderem o que acelera e o que o trava a sua resposta sexual e a da sua pessoa parceira.

Os travões podem ser qualquer coisa, situações traumáticas que ocorreram num dado momento da vida, dificuldades com a imagem corporal, stresse e preocupações na relação, parentalidade, trabalho, uma situação de infidelidade, etc.

Os aceleradores são tudo aquilo que nos liga e desperta sexualmente, tais como a atenção e o carinho da pessoa parceira, o toque (a pele é o maior órgão sexual que temos), uma massagem, uma boa conversa íntima, a conexão emocional, etc.

Os casais deverão aprender a comunicar sobre o que os liga e o que os afasta, o que necessitam, como necessitam, o que gostam e o que não gostam ou sobre as experiências da sua vida. Uma melhor comunicação está associada a uma melhor intimidade!

3. Aprender a comunicar abertamente sobre emoções e sobre sexualidade

Muitos de nós herdamos um legado de vergonha sexual e emocional, repleto de estigmas e tabus relacionados com a intimidade, com a vulnerabilidade e com o nosso corpo. Contudo, uma comunicação aberta demonstra ser bastante importante para os casais.

Desta forma, poderá ser importante os casais poderem agendar um check-in semanal específico para conversar sobre a sua relação, nomeadamente sobre sexo, emoções, necessidades, medos, anseios e fantasias. A ciência indica que os casais que conversam abertamente sobre as suas necessidades, emoções e sobre a sua vida sexual tendem a ter mais e melhor sexo.

4. Aprender que o contexto impacta o desejo

Todos nós, seres humanos, temos uma pequenina parte no cérebro designada núcleo de accumbens e que é uma parte do cérebro envolvida no circuito de recompensa. Desta forma, o núcleo de accumbens parece responder de forma diferente dependendo se nos sentimos seguros e relaxados, ou não. Se não nos sentirmos seguros, a sua ativação permite que nos afastemos de determinada coisa ou situação. Se nos sentirmos seguros, poderemos aproximarmo-nos de determinada coisa ou situação com maior curiosidade, interesse e disponibilidade.

Desta forma, o contexto de segurança impactará a forma como respondemos a nível sexual, com maior interesse e curiosidade e disponibilidade perante a aventura sexual.

5. Aprender que o desejo não é sempre espontâneo

O desejo espontâneo é aquele que parece que surge automaticamente, enquanto o desejo responsivo é aquele que surge quando estamos ou promovemos um contexto erótico, quando a pessoa parceira toca suavemente a nossa pele e nos faz recordar como é tão bom sermos tocado por aquela pessoa, desejando mais!

No desenvolvimento de uma relação, o desejo poderá não surgir sempre de forma espontânea e isso é normal. Desta forma, o casal deverá aprender sobre o desejo responsivo. A provocar o desejo, ou seja, a ativar os aceleradores da resposta sexual ou a desativar os travões.

6. Aprender a praticar rituais de conexão

Os rituais de conexão são os pequenos gestos diários que podemos fomentar e que nos trazem de volta à nossa pessoa parceira. Ou seja, são experiências compartilhadas repetidamente e que unem o casal. Por exemplo, reencontrarem-se no regresso a casa e dar um longo abraço, um café da manhã em conjunto, um beijo de 6 segundos, encontros românticos semanais, quinzenais ou mensais, verbalização de apreciação ou elogios. O tempo de qualidade ou os pequenos gestos de conexão e comunicação assumem-se como protetores da relação.

Desaprender ou aprender de novo implica refletir sobre a relação e tomar novas ações e gestos, no sentido daquilo que sabemos que promove a construção diária de conexão. Gestos que conduzem a uma maior segurança emocional, promovem maior conexão. Gestos que conduzem a maior conexão, promovem maior prazer sexual! É esta a grande revolução do prazer sexual e que advém de relações mais seguras e conectadas emocionalmente.

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